segunda-feira, 6 de outubro de 2008

PELA CIDADE IV - Noite

Depois de me deparar com as bolas verdes de Catarina – leia olhos –, e, claro, não posso me esquecer, as proporcionais bolas pintadas também – leia seios –, lá no bar Anexo, Cícero e eu parávamos no Lero-Lero mesmo. Cícero conseguia me convencer àquilo. Uma boate entupida de universitários playboys e suas meninas cujo nariz detecta o cheiro de gasolina a quilômetros. As meninas até que eram umas gostosas, mas quem ali conversaria com um cara de terno aparentando trinta? Sentia que estávamos no lugar errado. Cícero logo se adaptava. Freqüentara muito o Lero-Lero nos tempos da faculdade, no mínimo.
- Não está curtindo, Jorge?
- O que você acha? Isso aqui é um formigueiro. O tumulto está inibindo a minha vontade de beber. Levaria um dia inteiro para chegar até o balcão.
- Mas esse é o bacana. Pode roçar em algumas bundas até lá.
- Que bela dica, Cícero. Deu-me até sono.
- Vamos! Esqueça os olhos daquela maluca. Olhe ali.
- Onde?
- Ali!
Cícero apontava.
- O quê?
- Está vendo aquela morena de verde?
- Sim. Aquilo é verde? Essas luzes me atrapalham, merda!
- Sim. É verde, Jorge! Mas esquece a cor. Ligue-se na morena.
- OK.
- Não é linda?
- Ô...
- Quer conhecê-la?
- Não seria nada mau, mas o que vai fazer para tirá-la das garras daquela feiosa encalhada que está ao lado dela?
- Eu conheço as duas, Jorge. Deixa comigo. Venha.
Eu seguia Cícero até elas.

- Oi Claudinha!
Cícero cumprimentava a mais gata.
- Oi Cicinho! Tudo bom?
- Tudo ótimo! Oi Elaine!
Agora a feiosa.
- Oi Cicinho! Quanto tempo!
- Pois é. Muito trabalho. E por falar em trabalho, eu gostaria de apresentar um amigo meu lá do escritório, o Jorge.
- Oi Jorge!
- Oi Jorge!
Cumprimentavam-me as duas. Eu dava dois beijinhos em cada uma e voltava ao meu lugar de “amigo de Cicinho”. Como me chamariam depois de amigos? Jorginho? Giginho?

Logo começava um papo vazio sobre coisas que só interessam a formandos de vinte e poucos anos. Eu me sentia totalmente fora do contexto. Um garçom passava com uma bandeja cheia de cervejas e as vendia ali mesmo.
- Uma aqui, por favor! Quanto é?
- Sete.
- Nossa! Por uma long neck? Que absurdo!
- É.
Respondia-me o garçom.
- Viram isso? – Eu interrompia a conversa dos três. – Sete reais!
Eles me olhavam com uma cara interrogativa. Sentia-me o alienígena mendigo. Então eu disfarçava:
- Um bom preço, não?

Depois de alguns minutos:
- Jorge, faça companhia a Claudinha, sim? Vou dar uma volta com a Elaine.
Eu não acreditava. Cícero andaria, ou melhor, tentaria andar pela boate com aquele canhão que falava e me deixaria a só com aquele espetáculo de morena? Cícero eu te amo, meu garoto! Eu pensava.

A Claudinha era o tipo de mulher que sofre de solidão por conta da covardia dos homens que a cerca. Vou explicar. Quando uma mulher possui uma beleza muito elevada, ou seja, aquele tipo de coisa que pára tudo o que há em volta, o homem se sente tão inferior – o que normalmente ele já é por natureza – que adota tal beldade como uma visão ou um “estágio” inalcançável. Dessa forma, ninguém se sente apto a conquistá-la. Ela quer alguém e todos eles a querem. Ela espera por uma atitude e eles esperam pela coragem ou por um sinal verde, mas mulheres como a Claudinha nunca dão esse tipo de sinal.

A Claudinha tinha presença. Medidas calculadas com precisão. Cabelos longos negros até o meio das costas. Olhos castanhos claros. Uma boca que... Deixa. A barriga de fora exibia uma jóia no umbigo e um abdômen que delineava um caminho rumo ao sul e sem volta. Tudo nela era digno de uma boa olhada. Dos pés à cabeça, a Claudinha era admirável. E olha quem estava trocando palavras com ela ao pé do ouvido: eu. Corpos sarados olhavam para a cena sem acreditar. Cícero tinha condições plenas de traçar aquela escultura vestida de verde, mas a jogava na minha mão.
- Conhece o Cícero há quanto tempo?
Ela me perguntava.
- Pouco tempo. Ele chegou na empresa há alguns meses. Coitado. Não sabia nada de administração. Recém formado. Tornei-o um dos mais capazes lá da empresa.
- Nossa. Você então deve ser um deles.
- Perfeitamente.
Que cascata!
- Trabalha com administração há muito tempo?
- Há uns treze anos.
- Eu me formo no fim do ano.
- Que bom. Quem sabe não lhe dou uma chance por lá?
- Faria isso?
- Claro! Por que não?
- Ficaria feliz em trabalhar numa empresa tão conceituada como a que trabalha.
- Todos ficariam. O trabalho é puxado, mas você se adapta.
Outra cascata!
- Você é bacana, Jorge.
- Obrigado. Você é bastante simpática. Tem alguém?
- Como?
- Um namorado. Sei lá.
- Não. Hoje em dia está tão difícil encontrar alguém que valha a pena.
- Mas uma mulher linda como você, com esse tipo de problema?
- Assim eu fico sem graça, Jorge.
- Sabe o que acontece? Você procura esse alguém nos lugares errados.
- Como assim?
- Acha mesmo que encontraria alguém que “valha a pena” nesse tumulto de cabeças ocas?
- Acha isso?
- Claro! Quando quiser achar esse alguém, me avise.
- Por quê?
- A levarei nos lugares certos.
- Que papo esquisito, Jorge.
- Não. Esquisito é isso aqui. Cerveja por sete reais, um monte de gente vazia por dentro, gargalhadas sem causa justa. Acha mesmo que é aqui?
- Nunca tinha parado para pensar nesse lugar dessa forma.
- Então passe a pensar nisso, Claudinha. Disse para falar comigo porque eu conheço cada canto dessa cidade e o que eles têm a oferecer de bom.
- Quero experimentar.
- O quê?
- Quero experimentar esses cantos e o que eles têm de bom a oferecer.
- OK!

* * *
Estava a beijar afoitamente cada parte daquela pele morena. Já estávamos em um beco junto a um depósito de lixo de um fast food qualquer. Ela gemia como que num ato sexual. Mas o que era aquele meu jeito de beijá-la? Aquilo era sexo puro!
- Oh! Nossa! O que você tem?
- Tesão – eu dizia – fora do controle.
- Adoro isso! Adoro!
Não era esse tipo de canto que eu queria mostrar para a Claudinha, mas saindo do Lero-Lero a caminho do Bar Chorado, a mulher me puxava pela gravata de maneira violenta e ao mesmo tempo graciosa. Eu só pensava em uma coisa: O Cícero era um cara legal! As latas de lixo exalavam um odor insuportável, mas só fomos nos dar conta disso depois, quando catávamos nossas calças no chão.
- Eu não acredito que fiz isso.
Ela dizia.
- Eu acredito.
- Seu palhaço. Para onde iria me levar?
- Ao Bar Chorado. Gosta de chorinho?
- Isso não é coisa de velho, não?
- Não. Há uma garotada muito boa renovando o chorinho e...
Caminhávamos enquanto contava-lhe quase que a história da música popular nacional.
- Você não me parece um administrador.
- Não?
- Não.
- Pareço com o quê?
- Não sei.
- Você também não parece uma estudante de administração.
- E com o que pareço?
- É... Deixa.
Avistávamos o Bar Chorado. Banhados de suor, nós precisávamos de uma boa gelada. Mas por dois reais e cinqüenta centavos dessa vez.

[Continua]

* * *
Foto da Capa: Gabriel Andrade [meinframmer].

7 comentários:

Anônimo disse...

ééé...
cuidado qnd for trocar de bar...
hahahaahahahhaa

adoreeeeeeeeeeeeeeeiii!
super curiosa pro próximo =)

beijooo

Livia Queiroz disse...

hehehehe

eita caminho looooooooooongo esse de um abar até outro hein?
huahuahuahua


adoreeeeeeeeeeeiiiiiiiiiiiiiiiii

Será q finalmente Catarina dançou?
Pioooooor, será q essa estudante n eh colega de profissão de Catarina??

aguardareiiiii curiosíssima
hehe

bjaum

Janaina W Muller disse...

Aaah, não fui com a cara dessa Claudinha...gostei mais da Catarina! HAUhuah E o Jorge hein?! Se deu bem! Num beco com cheiro de lixo, mas se deu bem --'
Mas o que aconteceu com o Cícero? Teve de continuar fazendo companhia para a Elaine? HAUhauHAUHuahUHA XDDD

Abraços.
='-'=

Janaína Moraes disse...

Meu deus...
Posso saber de onde é que vc tira tanta sensibilidada para escrever?
Me dê uma dica só vai.

Passe no Estórias.

Anônimo disse...

AHA! adorei :D
esse foi o melhor dos 4!
amei a Claudinha e o Cícero se mostrou mó amigão.
tomare que a Catarina desapareça da vida do pobre do Jorge.
ah, e adorei a capa, muito boa :)

beeeijos ;*

Marcio Sarge disse...

Esta ai o grande segredo para adentrar no estreito de uma mulher(coração rs):

Atenção ao que é dito.

Vanessa Sagossi disse...

"o homem se sente tão inferior – o que normalmente ele já é por natureza" huahuahu...
^^