
Em seu pequeno acervo musical, Lúcio possuía quase todas as diferentes interpretações da referida música. Desde Julie London, Ella Fitzgerald, Joe Cocker até o Aerosmith. Para Lúcio, esta composição era o mais belo standard de jazz existente no planeta e por isso fora tantas vezes gravado por diversos intérpretes.
Além da melodia incrível, a letra era o que também chamava a atenção de Lúcio, que conheceu tal música na exata situação colocada nos versos da mesma. Uma ex-namorada o havia pedido perdão após ter tripudiado de seu amor. Um amigo lhe apresentou “Cry me a river” coincidentemente no dia do tal pedido. Foi assim:
- Lúcio. Sei que você não gosta de música, mas ouça isso aqui.
- Já disse que não ligo muito para esse tipo de expressão, Célio.
- Se você não gostar desse disco, eu mudo de nome.
- OK.
Tratava-se do LP Julie is her name da Julie London, de 1955. O disco abria com a canção que depois da primeira audição tornava-se para Lúcio a música de sua vida. Todo o restante do álbum o soava comum como todas as outras melodias que ouvia no cotidiano. A partir daí, o jovem viciado em livros passou também a colecionar discos que continham qualquer versão de “Cry me a river”.
Todas as versões o faziam chorar. E chorava um rio ao lembrar-se que Daniela não mais estava em sua companhia. Pensava que a música era cantada agora no intuito de fazê-lo chorar de arrependimento por não ter perdoado Daniela. Fez esforço para aprender a tocar o velho violão de seu pai, mas apenas os acordes de “Cry me a river”. Cantava-a diversas vezes por dia. Lúcio era já um mestre em “Cry me a river”.
Lúcio se via no meio de tantos discos empoeirados e fotos amareladas de Daniela. Já se passavam três anos após o último contato, mas ainda havia esperança por parte de Lúcio de que um dia iriam se encontrar novamente. O número do telefone de Daniela era escrito nas faces dos discos para que se lembrasse de ligar para ela quando ouvisse “Cry me a river”. Mas isso nunca acontecia. Medo era o que sentia. Medo de ouvir na voz de Daniela os versos que diziam “Agora você diz que me ama. Bem, para provar que sim, venha e chore-me um rio. Eu chorei um rio por você”.
Num certo dia, Lúcio tomava coragem e resolvia ligar para Daniela. Três anos. A dúvida era se o número ainda permanecia com ela. E permanecia.
- Alô.- Pois não?- É da casa de Daniela?
- É ela quem está falando, Lúcio.
Assustado:
- Ainda lembra de minha voz?
- Claro que sim.
- Faz tanto tempo que não nos falamos.- Por sua causa. Não recebi o seu perdão até hoje.- Pois é. Fui um idiota. Podemos nos ver?
- Claro. Quando?
- Hoje. Pode ser? Você ainda mora no mesmo local?- Sim. Passa aqui às nove. Pode ser?- Sim. Às nove.
Lúcio desligava o telefone sentindo-se bem melhor. Levantava a agulha da vitrola e desligava-a. Eram cinco da tarde, mas o rapaz já se encontrava em total ansiedade.
21h. Lúcio batia à porta de Daniela. Enquanto esperava-a, notava o quanto tinha mudado a fachada daquela casa. Nos tempos em que namoravam, as manchas de umidade tomavam conta de toda sua frente. Agora, via que estava limpa e com nova pintura. As janelas também; eram sujas e agora brilhavam.
- Oi, Lúcio.
Daniela estava linda como sempre. Nada havia mudado. Parecia um retorno ao passado.
- Você está linda, Daniela.
- Você também, continua lindo. Entre. Vamos até o meu quarto. Preciso lhe mostrar umas coisas.
Chegado lá, Lúcio se deparava com uma imensa coleção de discos.
- Daniela! Pelo que sei, você, como eu, não era muito chegada à música. Estou certo?
- Sim, mas depois que me deixou, Célio, nosso amigo, me apresentou um disco...
- Um disco da Julie London?
- Como sabes?
- Ele fez o mesmo comigo também.
O efeito causado por “Cry me a river” foi igual em ambos. Na verdade, Célio sabia que isso iria acontecer. No dia em que o amigo apresentou-lhes a canção, o mesmo estava de partida para a França.
- Lúcio. Veja o que ele deixou dentro do meu disco – dizia Daniela –, esse bilhete:
Vocês dois nasceram um para o outro. Chore um rio por ele e deixe que ele chore um rio por você. Mas depois das lágrimas, o perdão virá por parte dos dois. Ninguém será culpado de nada.
Ao som do disco que ocasionou o reencontro, um beijo tomava conta do quarto de Daniela.
Chegado em casa, o desligado Lúcio vai até o disco que Célio lhe dera. Havia um bilhete idêntico amassado no fundo da capa. Lúcio fecha os olhos e agradece a Célio pelo feito.
* * *
Conto publicado originalmente em 21 de abril de 2008 e retirado para participação de concursos literários.
8 comentários:
eu ADORO esse conto!!
Que lindoooo! Simplesmente, adorei. Final super feliz, fofo demais **
Abraços
='-'=
aaaaaai que saudade desse conto!
lembra do CD? rs
adorei!!!!!!!!
Lindooooooooo
vou até escutar essa musica
hahahaha
adorei...
Escutei algumas versões dessa música!
Fica um Dica: Escute a Versão de Susan Boyle
que conto lindo *-*
nossa, ainda não havia lido, tbm vou escutar essa música rs
:)
Triste e romantico! *.*
Triste e romantico! *.*
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