
- Alô!
Era a Márcia, minha produtora. Com uma voz animadíssima, ela me avisava que fechara uma sequência de shows pelo Rio de Janeiro. O calor típico da cidade a partir de novembro sempre rendia alguns trocados – na verdade eu não sei bem o porquê, já que sou um músico bossanovista e considerado por muitos a verdadeira “broxada do verão”.
- Quantos shows serão? – eu perguntava.
- De novembro a fevereiro, rapaz! Umas vinte apresentações! O que acha?
- Acho bom, muito bom! O que mais você tem a me dizer?
- Não me parece animado...
- É o calor...
- Ah... Bem, vou convocar os mesmos músicos que te acompanharam no ano passado, pode ser?
- Sim, pode ser!
Na verdade eu quase nunca me animava com os shows, mas é o meu sustento, o que posso fazer?
Depois de algumas semanas, um cartaz exageradamente colorido me chegava pelos correios. Tratava-se de um anúncio da minha primeira bateria de shows, num hotel bem bacana. A peça trazia “O verão, o sorriso e a flor” como nome do espetáculo. Uma forçada de barra horrível como se minha apresentação tivesse o peso e a importância do que foi “A noite do amor, do sorriso e da flor”, em 1960. E aquelas cores? Onde estava o velho preto com branco? Liguei de imediato para Márcia.
- Gostou do cartaz?
- Que mau gosto, Márcia! Que mau gosto!
- Por quê?
- Compara-me aos grandes da Bossa Nova?
- E por que não?
- Porque não sou! Simples! Não aprovo! Criem outra coisa!
- OK, mas pode ser para a próxima temporada? Porque para os shows do hotel já estão rodando esse aí...
- Você já colocou isso na rua?
- Desculpe-me! É que...
Desliguei o telefone e só fui rever Márcia na noite de estréia da temporada.
* * *
Fazia muito calor naquela noite. Durante a semana, o meu nome fora anunciado em tudo o que era jornal, e sendo muito criticado também, claro. Lembro de ler uma matéria que chamava o meu show de “a brochada, o desânimo e a dor”. Eu nunca entendi bem essas críticas, já que as pessoas – pelo menos as que compareciam aos shows – gostavam bastante de mim.
Márcia, ao me ver:
- Tinha medo que não aparecesse!
- Jamais faria isso!
- Não me falou sobre os ensaios, sobre nada! Eu NÃO sei que repertório apresentará! Eu sinto que NÃO produzi o seu show! Por que não me demite?
- Jamais faria isso!
- Mas parece insatisfeito com o meu trabalho!
- Foi só o nome do show, mas nada! Está tudo bem!
- OK! Bom show para você!
- Obrigado.
Fiz o show como sempre faço: metade músicas minhas, metade clássicos da Bossa Nova. O público, estranhamente abarrotado de jovens, adorou. Teve até uma menina, que aparentava viver em plena décima oitava primavera, no máximo, que veio até a mim e disse:
- O verão ainda não chegou, mas você é o melhor anúncio de que ele está por vir! Adoro você!
Fui até Márcia:
- Muitos jovens, você viu?
- Vi, sim, claro!
- O que fez para isso acontecer?
- Um cartaz colorido, ora!
5 comentários:
Rá! Nada é mais poderoso que um cartaz colorido (NOT)! XP
Errado! Nada mais vulnerável que a juventude atual.. ;)
Que tal:
Nada é mais poderoso que um cartaz colorido com a vulnerável juventude atual.
^^
Muito bom Luciano, divertido, leve.
Estava com saudade daqui.
Abraço.
Hauauhauha. Gostei da definição, Luciano!
haha, gostei! bem bacana :)
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