quarta-feira, 12 de novembro de 2008

DUAS II - Percepção

Naquela semana, a escola onde Luana e Giovanna estudavam anunciava a proximidade da Semana de Novos Talentos. Uma forma que a instituição tinha de incentivar e descobrir alunos talentosos em diversas áreas, como artes, ciência, esporte etc. Seria uma semana inteira sem aulas, porém, repleta de atividades que costumavam deixar a escola mergulhada num agito ora atraente, ora infernal.

Na semana anterior ao evento, não se falava em outra coisa entre os alunos. Bandas musicais, times de futebol, grupos de dança e tantos outros alunos munidos de seus dotes faziam uma enorme fila no auditório para a inscrição. Embora parecesse um verdadeiro caos, a escola tinha tradição na organização de tal evento, o que garantia que no final tudo correria bem. Mas a impressão inicial era, sim, de uma reprise do festival de Woodstock, de 1969, onde a desordem gerou inclusive a fome de seus participantes.

Luana e Giovanna se viam no meio daquela correria toda.
- O que vai apresentar na SNT desse ano, Luana?
- Eu? Nunca apresentei nada. Não será nesse ano que a coisa mudará. E você?
- Eu só me apresentei uma vez. Com os meninos lá da sala. Apresentamos-nos no Corredor da Tecnologia.
- E o que apresentaram?
- Um software capaz de lhe dar as condições matemáticas de aprovação ou reprovação no ano letivo com base nas suas notas de anos anteriores.
- Que interessante...
Luana mostrava pouco interesse, na verdade.
- Pois é. Ele lhe dava até a nota que poderia alcançar caso você fosse para a prova final. Aqueles meninos são uns gênios. Você precisa conhecer.
- O software?
- Não! Os meninos da minha sala.
- Ah, não, obrigada.
- Bem, eles são inteligentes demais. Eu garanto.
- Nota-se, mas... Melhor não.

No dia seguinte, Giovanna chegava até Luana com a notícia de que participaria da SNT.
- Em que corredor? Tecnologia?
Perguntava Luana.
- Não, não. Artes.
- E o que vai apresentar?
- Poesia.
- Escreve poesia?
- Sim. Nunca lhe disse, pois sei que és leitora conhecedora e as minhas poesias são muito amadoras, Luana.
- Fiquei curiosa agora. Pode me mostrar uma?
- Posso. Passa lá em casa hoje à tarde. Assim me ajuda a escolher as melhores para o evento.
- Então, pelo visto, tens muitas poesias.
- Sim. Cerca de duzentas.
- Nossa. Passo lá sim.
- OK, Luana!

Chovia muito naquela tarde, mas nada impediria Luana de ler os escritos da amiga. A menina ligava para o pai e perguntava se ele viria almoçar em casa, a fim de aproveitar uma carona na sua volta para o trabalho até a casa de Giovanna.
- Eu não ia não, filha. Mas vou quebrar o seu galho.
- Você é o melhor pai do mundo, sabia?
- Eu sei disso, Luana. O cara que tem a melhor filha do mundo só pode ser o melhor pai do mundo também.

* * *
O quarto de Giovanna encontrava-se repleto de papeis. A cama e o chão estavam completamente forrados deles. Era muita poesia. Giovanna sentia-se envergonhada com a chegada de Luana, já que temia a opinião da amiga sobre seus versos.
- Meu Deus, Giovanna! Será que consigo ler isso tudo?
- Sim. São pequenas. A maioria tem no máximo quatro estrofes de quatro versos.
- OK. E por onde começamos.
- Acho melhor descartarmos as mais antigas, Luana. Eu era muito pequena ainda. Acho que de um ano para cá a coisa fluiu melhor. São essas aqui.
Giovanna apontava para uma pilha de mais ou menos cinqüenta folhas.
- Melhorou.
Aliviava-se Luana, que começava a ler imediatamente.

Luana lia e separava os escritos formando duas pilhas, provavelmente uma significava “apta” e a outra “não apta”, na cabeça de Giovanna, que roia as unhas. Luana lia sem dar sequer um pio. Apenas lia e as colocava ora numa pilha, ora noutra. As duas pilhas se encontravam uma em imensa desvantagem da outra. Restava saber o que aquilo significava. Giovanna roia mais as unhas, mas não deixava de observar o empenho de sua amiga em ajudar. Singelos sorrisos saltavam de seu semblante ao notar expressões de encanto no ler de Luana. Giovanna a adorava num limite jamais alcançado.
Tempo depois:
- Pronto!
Dizia Luana, após quase uma hora de leitura ao colocar a última folha numa das pilhas.
- E então? O que você achou? O que significam essas pilhas? Essas são as boas e essas as ruins? É isso? Fala!
- Giovanna, todas, escute bem, todas as suas poesias são lindas demais! Estou sem palavras para descrever a profundidade e o bom gosto de suas palavras. Você é uma escritora, amiga!
- Ai, Luana. Obrigada. Mas o que significam essas duas pilhas?
- Bem, essas quarenta e poucas aqui são boas demais e merecem serem inscritas na SNT. Essas quinze também são muito boas, mas não acho que o Marcelo mereça tais versos. Mas fique à vontade para inscrevê-los também. As poesias são suas.
- Mas como você sabe que foram para o Marcelo? Eu não citei o nome dele em nenhuma delas.
- Giovanna, por favor, eu vou lhe dar só um exemplo, OK? Olhe essa aqui:

O SEU VENTO

Esse vento que me deixa gélida
Uma aparição nostálgica dia após dia
A vontade de que me carregue
Momentos antes de me dar as costas

Os piores de todos os deveres são:
Manter-me firme diante do vento,
Amar o ser que o vento me traz e
Rasgar as montanhas que lhe envolvem

Chutar as lágrimas que deixo pelo caminho
E andar sobre piso seco, porém, os molhando,
Lembra a rotina de todas as ruas
Onde seu vento passa de leve e enxugando


- O que percebeu?
Perguntava Giovanna.
- Ora, esse tal vento só pode ser uma ligação entre o sentimento que Marcelo lhe causava e o vento que ele produz ao passar tão rápido por ti em sua bicicleta. E outra. Veja as iniciais de cada verso, formam a frase “Eu amo Marcelo”.
- Nossa...
Luana acertava em cheio os objetivos da amiga em cada palavra usada, o que deixava Giovanna espantada e ao mesmo tempo feliz. Muito feliz. Encarar a SNT com o apoio de Luana seria bem mais fácil do que Giovanna imaginava.
- Então? Vamos selecionar as melhores das melhores?
Com um sorriso contagiante, Luana entusiasmava.
- Vamos!
Confirmava uma sorridente Giovanna.

[Continua]

* * *
Foto da capa: Ana Claudia Temerozo.
Mais histórias sobre Luana na série LUANA (Setembro de 2008).

9 comentários:

Anônimo disse...

aaaaahhh mto bom!
caramba, o joguinho com as iniciais foi ótimo! e que sensibilidade dessa Luana hein...
realmente muito bom!

sexta tem maaais!
0/

Kayo Medeiros disse...

Que butininho!

=)

Janaina W Muller disse...

Muito lindo ;_;
E o poeminha tá lindo demais também...adorei a Luana, ela é realmente muito sensível. Mas Giovanna é meiguinha demais >3< Enfim, tudo muito fofinhoo :D

Abraços.
='-'=

Livia Queiroz disse...

aaaaaaaaah me fez lembrar d eum concurso de poesia que participei na escola quando eu era 8° série...não ganhei!!!!
Mas foi bacana e um dia desses achei a tal poesia e pensei: "nossa que horror!!!"


Adorei a poesia de Giovanna, acho q ela ja ganhou!!! hehehe

bjaum aguardo a continuação

Anônimo disse...

que lindo!
a poesia da Giovanna é realmente muito bonita, e acho bem legal que as duas estejam se dando bem, afinal elas só tem uma a outra.
Mais uma vez, fico na espera da continuação ;)

bjos

Anônimo disse...

adorei!
e ainda fiz os comentários no msn enquanto lia...
hahahahaha

Beline Cidral disse...

Muito boa tatica poetica... quase um pseudonimo! Acho que vou come'car a usa-la!

Vanessa Sagossi disse...

Só quero ver aonde isso vai dar...

Anônimo disse...

aah adoreei a paradiinha daas letrinha no começo;
qii esperta elaa ;D