terça-feira, 7 de agosto de 2012

OS BASTIDORES DOS BASTIDORES: A minha história numa banda de Heavy Metal – Parte IX


O show de lançamento de Alone In The Dark, no Bar do Blues, foi bem bacana. Não possuo registros do set list daquela noite, mas acho que tocamos as cinco músicas do EP e algumas covers, como “Breaking The Law” (Judas Priest), “Powerslave”, “Phantom Of The Opera”, “The Prisoner” (Iron Maiden), “Seek And Destroy” (Metallica), entre outras.

A banda estava “redondinha”, pois havíamos ensaiado bastante para aquele show. Não me lembro bem quantos EPs nós vendemos após a apresentação, mas sei que vendemos alguns, sim.

Com o EP oficialmente lançado, chegava a hora de divulgá-lo para a imprensa especializada. Mas ainda precisávamos consertar a arte do EP, por conta daquela estúpida coincidência com o CD da Restless. Fui bem rápido nesse processo. Precisava ser.

Lembrei então de uma história muito louca que é a de um pintor italiano chamado Bruno Amadio, que, com o pseudônimo de Giovanni Bragolin, ficou famoso entre as décadas de 1970 e 1980 com uma série de quadros de crianças chorando. Diz a lenda que Bruno fizera um pacto com o Diabo para conseguir vender suas obras; em troca do sucesso, Bruno somente pintaria crianças tristes, em imagens cheias de mensagens subliminares – dizem até que muitas dessas crianças eram retratadas mortas, por conta das pupilas dilatadas.

Minha mãe possuía dois quadros dessa coleção em casa, isso quando eu ainda era muito pequeno. Quando ela ficou sabendo de tal história, os quadros foram parar no lixo. Mas o fato é que esse lance nunca saíra da minha cabeça. Era estranho, perturbador e ao mesmo tempo muito interessante para o marketing de Alone In The Dark, cuja faixa título contava uma história que envolvia uma criança e um pacto.    

Então tive a ideia de ilustrar a capa de Alone In The Dark com um quadro de Bruno, ou melhor, de Giovanni Bragolin. O quadro escolhido retrata uma menina (conforme a letra de Renato e Rodrigo) com olhar vazio, para cima, e chorando. Mas se notarmos bem a imagem, será possível identificar um braço a enforcar a menina. Cruel, não? Mas não tínhamos tempo para uma ideia melhor, então, com a aprovação do restante da banda, mandamos Renato rodar as novas capas.

A capa de Alone In The Dark causou certo rebuliço entre os mais chegados à Over Action. Nossas famílias nem tanto, até porque não tivemos nem o trabalho de explicar a elas tal conceito, pois seria um verdadeiro inferno em nossas casas – até onde sei, nossas mães eram católicas fervorosas, com exceção da mãe de Leonardo, eu acho.  O rebuliço se dava mesmo quando resolvíamos explicar o significado da capa aos amigos. Houve até casos de pessoas que compraram o EP e se recusaram a levar a capa para casa. Dá para acreditar?

Com uma quantidade boa de cópias do EP nas mãos, fiquei encarregado de fazer o envio para as revistas e websites, com release e foto de divulgação (uma foto horrenda, diga-se, tirada no lado de fora do estúdio do Flávio). 

Enviei o material para as revistas Road Crew, Rock Brigade (as mais importantes na época) e mais algumas outras que não me recordo. Enviei também para alguns fanzines, seguindo o conselho de Marcelo Fernandes, o vocalista da lendária Solstício (banda de hard core de Cabo Frio, Rio de Janeiro), que morou um tempo lá em casa, dividindo um quarto com meu irmão.

Passadas algumas semanas do envio – não preciso dizer que todos nós vigiávamos as bancas de jornal atrás de algum retorno, né? –, nossa primeira crítica nos vinha pela conceituada Road Crew, em sua edição de setembro de 2002. Ricardo Batalha discorreu assim sobre a Over Action:

As construções das músicas (...) são muito legais, um Metal bem tradicional e trabalhado. Rodrigo Santos (vocal e guitarra), Luciano Freitas (guitarra), Renato Ferraz (baixo) e Leonardo de Andrade (bateria) formam esta banda que é mais uma prova de que o estilo mais clássico do Metal está ressurgindo com tudo no Brasil. As pontes e refrãos, especialmente na faixa The Winner, são bem interessantes. Sabe o que falta? Correção na pronúncia do inglês, melhor impostação da voz e uma produção com mais nível. Corrigidas as falhas, o Over Action vai ser um grande nome do Metal nacional. Pode apostar!

Apesar das críticas construtivas, ficamos muito felizes com a resenha! E como no EP era o endereço de minha casa que aparecia na aba de contatos, não demorou muito para eu começar a receber uma boa quantidade de cartas sociais (daquelas que saem a R$ 0,01 cada), vindas de todo o Brasil, pedindo uma cópia de Alone in The Dark, que a gente vendia por R$ 5,00. Algumas cartas vinham com uma nota de R$ 5,00 enroladinha dentro. O underground era uma coisa hilária mesmo.

As cartas não paravam de chegar e novas críticas também surgiam na internet. Lembro de um website dar nota 10 para Alone In The Dark em sua resenha. Os fanzines também falaram bem de nosso EP e tudo isso só nos animava a continuar trabalhando.

Mas a crítica mais esperada mesmo era a da revista Rock Brigade. Uma grande besteira, analiso hoje, mas ganhar uma boa resenha da RB, para nós, naquele momento, era como receber uma benção! E se a Road Crew já nos gerara certo reconhecimento na cena, o que esperar como resultado de um elogio da parte da grandiosa RB?

Sabíamos que não seria fácil – uma (excelente) banda chamada Allegro, da qual gostávamos muito, recebera, pouco antes, péssima resenha da RB. E de fato não foi. Em sua edição de novembro de 2002, a RB, por meio de jornalista cujas iniciais são ACM, disse:

(...) Se todos os grandes artistas dizem que “criar é 10% de inspiração e 90% de transpiração”, é porque algum fundo de verdade ela deve ter. Tudo isso para dizer que estamos diante de uma banda esforçada, mas que ainda deve ralar muito em alguns quesitos básicos. A timbragem das guitarras está errada, a execução é primária e a gravação deixa muito a desejar. Mas o principal é que o pessoal não tem a manha de compor músicas legais. Assim, o metal tradicional do quarteto repete todos os clichês possíveis e imagináveis, sem acrescentar nada que tenha a identidade da própria banda. Ou seja, não passa de um grupo bem-intencionado. O que, todos sabemos, é muito, mas muito pouco mesmo. 

Ou seja, um balde de água fria!

Muito, até os dias de hoje, já se foi discutido, entre nós da Over Action, sobre essa resenha da RB. Mas o que fazer naquele momento? Desistir da banda por conta de uma opinião “jornalística”? Ficamos frustrados, sim, qualquer banda ficaria, até porque não concordamos com pelo menos metade daquela resenha.

Alguns dias se passaram e, quando me perguntavam sobre a Rock Brigade, eu dizia: “Foda-se a Rock Brigade! Ainda vejo a galera bater muito a cabeça em nossos shows! Isso sim é um termômetro!”

Antes das citadas resenhas, mais três shows da Over Action tinham ocorrido, mas falarei delas no próximo capítulo.

[Continua]  

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