quarta-feira, 26 de março de 2008

A EXCEÇÃO

- Eu posso sentar-me aqui?
Perguntou Leandro.
- Claro!
Respondeu Michele.

Às 7h da manhã, naquele assento da estação Carioca do Metrô, dois pontos distantes se aproximavam. Ele esperava o trem no sentido Sul. Ela, sentido Norte. Leandro ofereceu um biscoito do pacote que havia guardado desde o fim da tarde do dia anterior. Michele, em jejum, morrendo de fome, ainda assim não aceitou, puxou um livro esquecido na bolsa e começara a ler.



- Já li.
Atirou Leandro.
- Que bom.
Rebate Michele.

Naquele momento, a menina já começa a suspeitar que Leandro a qualquer custo pretende iniciar algum assunto, seja ele qual for. Biscoito, livro... Michele continua lendo enquanto aperta a barriga que tanto doía.

- Devia ter aceitado o biscoito.
Diz Leandro.
- Por que?
- Porque estás com fome. Está estampado.
- Engano seu. Acabei de tomar um café delicioso com o meu namorado e estou super bem, não precisa se preocupar.

Michele nem namorado tinha e sua geladeira pela manhã só tinha uma garrafa de água e um iogurte que deixara para Betina, sua irmã mais nova, levar para o colégio. Michele partia com a única garantia do almoço servido no refeitório da empresa onde trabalhava. Já se passava do dia 27 e seu salário, assim como as compras, já era coisa do passado. Inventara aquele “café da manhã romântico” para afastar o rapaz inconveniente. E conseguiu.

Leandro levantou-se e esperou o trem em pé. Foi quando Michele conseguiu enfim olhá-lo. Olhou-o dos pés à cabeça. Olhou o pacote de biscoito ainda pela metade. Observou os farelos do alimento que saltavam da boca de Leandro sem repulsa. A dor na sua barriga aumentou. Levantou e foi até o rapaz.

- Acho que vou aceitar seu biscoito.
- Seu namorado tomou o café todo sozinho?
- Não tenho namorado.
Respondeu Michele com um sorriso sem graça.
- Foi o que imaginei.
- Por que? Por que eu não poderia ter um namorado?
- Porque eu acredito que o destino não seria tão cruel a ponto de colocar no caminho de um homem solitário e com um pacote de biscoito uma menina comprometida e sem fome.

Michele sorriu diante da frase, retirou dois biscoitos do pacote e saciou-se. O trem de Leandro se aproximou.

- Quer ficar com o pacote?
Ofereceu Leandro.
- Não, obrigada.
- Tem certeza?
- Tenho. Estou bem.
- Quero lhe ver mais vezes. Como faço?
- Vai perder o trem.
Respondeu sorrindo.
- Não quero lhe perder. Qual seu nome?
- Michele.
- O meu é Leandro. Amanhã nesse horário e nessa estação? Pode ser?
- Estarei aqui.

O tempo passou e os dois passaram a se encontrar pontualmente todos os dias pela manhã naquela estação. Eles se conheciam cada vez mais enquanto o carinho demonstrado por Leandro crescia proporcionalmente. A defensiva de Michele só ajudava ainda mais a vontade de Leandro em beijá-la. O rapaz foi paciente e deixou que a intimidade entre os dois surgisse naturalmente. E foi o que aconteceu depois de três semanas.

Michele, àquele ponto, já se encontrava perdidamente apaixonada por todos os gestos e jeitos de Leandro. Sentia que estava na hora de abrir-se para um primeiro beijo. Chegou como sempre às 7h à estação e ali esperou pela chegada de Leandro, sempre precedida de um perfume capaz de enlouquecê-la.

- Oi Michele.
- Oi Leandro.
- O que vai fazer amanhã à noite? Estudar de novo?
- É o que costumo fazer todos os sábados à noite. Mas neste sábado estarei aberta a sugestões.
- Que ótimo. Um cinema. Que tal?
- Eu topo.
Respondeu Michele com um sorriso animadíssimo.
- Só ainda não sei bem onde moras.
Michele explicou seu endereço para Leandro e combinou um horário para que pudesse buscá-la.

No sábado, foi tudo perfeito. O filme, o beijo, o lanche, as risadas e a despedida. Michele acordou no domingo flutuando em sonhos típicos de inicio de romance. Como de costume, foi comprar pão e jornal. Com a bisnaga debaixo do braço e o jornal em direção aos olhos, se depara com a foto de Leandro no canto inferior direito da primeira página. A manchete: “Preso na madrugada de ontem, Leandro Nogueira de Sá, reconhecido por vítima sobrevivente como Maníaco do Metrô”.

Sem chão, Michele vai até a página da matéria e lê o que o coração custa a acreditar. O rapaz que conhecera na estação tinha o hábito de seguir e matar mulheres após estupro. Leandro tinha sido reconhecido por uma vizinha de Michele que o avistou no sábado e o denunciou à Polícia.

Michele procurou por Norma, a sua vizinha, para saber mais sobre o caso. Norma se assustou ao saber que Michele seria possivelmente a próxima vítima de Leandro e contou como o criminoso agiu.

- Ele me viu na estação do Metrô, tomou o mesmo trem que eu, saltou na mesma estação e me seguiu até uma rua deserta. Tentou me agarrar, mas não conseguiu. Corri muito naquele dia, mas nunca me esqueci do rosto dele e nem do odor que exalava. No sábado, quando o vi aqui pela rua, ele estava cheiroso, porém, a cara dele não me deixou dúvidas. O resto você já sabe.

Michele percebe o quanto tinha sido diferente a abordagem de Leandro à sua pessoa. Se ele era tão perigoso assim, por que lhe dera o nome verdadeiro? Por que se perfumava para ela? Por que não a seguiu em nenhum dia durante as três semanas de amizade? Muda, Michele vai para casa. Deita na cama e passa o resto do domingo divida entre a tristeza e a felicidade de ter talvez mexido e mudado um coração tão cruel.

4 comentários:

Chris Ferlon disse...

ih!
esses dias eu fui abordada no metrô!
será q era leandro? =O

Henrique Monteiro disse...

Texto perfeito.

Vi este texto em outro blog, e lá tinha um link para seu blog.
Parabéns pela trama, cara.

E agora? Ele estava fingindo ou ela havia realmente mudado o modo dele?
Só você pode dizer.

Quero ler mais do seu blog depois, por isso vou te linkar no meu.
Um abração.

Anônimo disse...

clap clap clap p vc, luciano freitaaaaas!


*na quarta-feira estive na mesma estação... CARIOCA.




beijobeijo.

Anônimo disse...

Nossa! Que legal Luciano! Que talento!

Só tem um problema, tenho que saber o final da estória!! rsrs
Muito bom, Parabéns!