sexta-feira, 19 de setembro de 2008

LUANA III - O Mundo Real

Terça-feira. No escritório, Marcos e Patrícia conversavam sobre o progresso que cada um tivera rumo à confiança de Luana. Eles se encontravam felizes diante dos resultados positivos que o jantar da noite anterior os proporcionara. Patrícia sentia que Luana, a partir daquela noite, era mais “filha” que enteada. Prometera à Luana que não tocaria no assunto sobre o tal Daniel com o Marcos e assim cumpria com a palavra. Embora achasse errado, era um laço maior com a menina que estava em jogo. Além do mais, que mal haveria naquela paquera de adolescente? E mais; o relacionamento de Luana e Mimi, além de curioso, era a garantia de uma inocência que anulava qualquer desconfiança de algo mais sério naquela história com o Daniel.

Na escola, Luana recebia um bilhete jogado de alguma das carteiras do fundo da sala. O bilhete caia-lhe sobre o colo assustando-a. Estudiosa como poucos por ali, Luana não desviava sua atenção à aula. Controlava facilmente a curiosidade – quase inexistente – e guardava o papel dobrado dentro de seu estojo. Luana não falava mais que o necessário com os demais alunos. Nunca destratara ninguém por ali, mas ao mesmo tempo não se podia esperar da menina uma atenção maior às banalidades que tomavam quase todos os assuntos de seus colegas. Tudo aquilo lhe soava cansativo e sem importância alguma. Luana ocupava-se quase sempre de livros ou fones de ouvido. Muito pouco, no intervalo, conversava com Giovanna [Vide “Por que ele?”, publicado neste blog em 17 de maio de 2008], uma menina calma e tímida de uma sala vizinha.
- Oi, Luana. O que está lendo?
- Poesia. Tudo bem, Giovanna?
- Tudo. E com você?
- Também. E então, já esqueceu aquele ridículo do Marcelo?
- Não fale assim, vai. Eu não sei o que ele tem, mas... Ele é tão...
- Tão imbecil. É o que ele é, Giovanna.
- A Lorena, aquela amiga dele, me procurou. Disse que quer me ajudar com o Marcelo.
- Giovanna, distancie-se desse pessoal. Para o seu próprio bem. Você é linda, inteligente... Pode almejar algo mais do que esse Marcelo, não acha?
- Luana, não me deixe mais confusa. E vem cá! E o Daniel? Já conseguiu falar com ele?
- Nada. Estou na mesma.
- Entendo. O que as outras meninas têm que nós não temos, para esses meninos estarem sempre ao lado delas?
- Olha, nem vem! Há sempre uns meninos interessantes na sua cola, vai.
- Que nada. São inteligentes até, mas perdem muito tempo com jogos de RPG. Um saco.
- Giovanna! Vou te dizer então o que as outras meninas têm para atrair os idiotas. Elas têm vulgaridade no agir e um vasto vocabulário de baixarias. Mas há uma coisa que temos e que elas não têm.
- Diga.
- Cérebro!
- [Risos] Concordo, Luana!
- Já ia me esquecendo. Alguém me jogou um bilhete na sala de aula.
- E o que dizia, Luana?
- Não sei. Verei agora!
Luana pegava o papelzinho e abria-o.

Se eu saber de alguma coisa de vc e Daniel eu vo mata vc.
Assinado: A namo dele!


- E então? O que diz o bilhete?
Perguntava Giovanna.
- Bem, pelo que entendi desse novo dialeto, alguma descerebrada vai me matar caso eu tenha algo com o Daniel. Mas como essa pessoa que mal sabe escrever notou meus sentimentos? E ela assina como namorada dele. “Namo” é namorada? Deve ser, não?
- É. Que horror. Mas você não anda dando bandeira demais?
- Sei lá. Mas estou intrigada com uma coisa. Daniel não tem namorada. Não que eu saiba.
- E o que vai fazer, Luana?
- Nada. Continuar lendo o meu livro. É mais válido.
- Não tem medo dessa garota?
- Medo? Tenho é pena, coitada. Uma mensalidade tão cara como a que nossos pais pagam, e essa menina sem saber escrever [risos].

Luana concluía que Mimi estava certa ao bocejar diante dos casos sobre meninos. Eles não valiam os aborrecimentos que os cercavam. Tudo o que ela queria naquele momento era continuar sua leitura debaixo de sua árvore favorita enquanto os outros alunos formavam suas correntes humanas pelo pátio como que num passeio meio fútil meio gincana. Coincidência ou não, os versos que Luana lia no exato momento, de um poeta contemporâneo qualquer, diziam:

Não se deve temer a nada,
exceto ao temível temor de temer
De nada adianta o medo
sejas tu um braço ou um dedo

Lamento pelo pobre de alma,
sem razão no destino de sua ação
de amedrontar aqueles cuja palma
permanece ao chão

Erga sua cabeça num movimento brando
Mente munida de idéias acima da superfície negra
de um mar calmo e de pouco encanto
Que se impõe por gritos ao invés de canto

Tu que dependes hoje
do aval de um intelecto cego,
e da piedade da barbárie opaca
Deixo-te o pensamento como se fosse faca.

Luana fechava o livro, o colocava sob as pernas já esticadas ao longo do banquinho e sentia-se forte por agora ter Patrícia para durante a noite conversar a fim de saber que medidas tomar frente àquela situação. Não que Luana se preocupasse com o conteúdo agressivo daquele bilhete, mas saber que alguém se incomodava com o seu gostar lhe fazia pensar seriamente em jogar tudo para os ares. Os bocejos e miados de Mimi diriam, logicamente, para que esquecesse Daniel e sua “namorada”. Nem contavam os conselhos que poderiam vir de Giovanna, já que se encontrava apaixonada pelo mais idiota dos meninos. Era a hora de colocar sua confiança em Patrícia em prática. Hora de romper os bloqueios e encarar um mundo real.

[Continua]

* * *
Foto da Capa: Ana Claudia Temerozo.
Versos citados: “O Pensamento Contra O Medo” de Luciano Freitas.

10 comentários:

Anônimo disse...

ahhhh! adorei a ligação com o outro conto!
Eu ja havia lido, mas não lembro de ter comentado com vc...rsrs

to ficando curiosaaaaa!
adorei, lu!
:)

beeeeeeeeeijo

Erich Pontoldio disse...

Muito legaln ... o melhor é que teremos próximos capítulos.

Anônimo disse...

Tbm to curiosa sempre na melhor parte acaba,eu disse melhor parte? ah que isso todas partes sao Boas,Adoro tudo que vc escreve Luciano....Amanha tem amis ne??

Anônimo disse...

esse ficou ainda melhor *-*
adorei os versos!
to adorando cada vez mais haha :)
tchauzinho, lu.
..
*

Anônimo disse...

simples e bacana.


*eu gostei dos versos, sr freitas.


beijão... continua...

Ju Barreto disse...

gosteiii *--*
muito mesmo parabéns

Leonardo disse...

Gostei muito...
Agora é só esperar para o proximo capitulo...

Abraços!

Lucas disse...

Vim te avisar que foste linkado no meu blog. =)


Conto muito bem contado. Parabéns.

Acho que já disse que as capas são um charme a parte, não!?


Até Alí;

Anônimo disse...

Uiiia; adoreeei tdaas as 3 (:

As capaas ficaraam otiimas.





;ººº lúú

Livia Queiroz disse...

To anciosa com o q está por vir!